UM COMBATE ESSENCIAL...

Na semana passada, quando aqui denunciava a exploração doméstica a que estão sujeitas muitas das trabalhadoras que fazem da actividade doméstica o seu magro ganha pão, estava longe de imaginar que a Inspecção Geral do Trabalho, entidade a quem compete intervir em tal matéria, por coincidência, três dias depois, viesse a terreiro com uma declaração de intenção de aumentar a sua acção fiscalizadora em diversos ramos de actividade, entre os quais no sector doméstico.

Sem dúvida que, com enorme dimensão, provocando danos sociais, financeiros e económicos, a situação do sector doméstico, construção civil, seguros, banca e grandes superfícies comerciais é vergonhosa e deplorável. Compreender o fenómeno passa por perceber que a mesma se deve a uma consequência da não operacionalidade da acção fiscalizadora por parte dos organismos do Estado a quem compete fiscalizar.

O facto de um trabalhador ser sujeito a prestar trabalho para além do seu horário normal de trabalho sem ser remunerado é uma exploração que compete ao Estado combater em exclusividade. É necessário que se entenda que esta é uma das vertentes de protecção fundamental que tem de ser assegurada ao trabalhador, tal como supostamente é garantida a protecção na doença ou no desemprego.

Trata-se de uma combate sistémico que visa assegurar ao trabalhador o direito ao descanso e o direito à remuneração. Todavia a protecção daí resultante é ampla e abrangente, indo do trabalhador à protecção da sua família, sendo capaz de favorecer a criação de mais postos de trabalho, além de o Estado poder arrecadar receitas e ao mesmo tempo reduzir despesas.

Um dos problemas no combate de tais situações prende-se com o facto de não se poder contar com grande apoio por parte dos trabalhadores explorados, na medida em que, fruto de uma situação de fragilidade, de medos e receios de perda do posto de trabalho, apenas em situação de ruptura do vínculo laboral será capaz de denunciar.

Nos períodos em que grassam as crises económicas, com índices elevados de desemprego, é conferida uma maior «legitimidade» aos ímpetos exploratórios por parte de tais entidades empregadoras, visto que os trabalhadores se tornam mais vulneráveis, mais sujeitos a pressões e mais receosos com a possibilidade de perderem o pouco que possuem.

Tinha sido anunciada, em 2004, a criação de uma polícia fiscal, pelo então Ministro Bagão Félix. Tal como o Governo de então a ideia caiu por terra e neste ímpeto do Governo de Sócrates de reduzir o número de funcionários do Estado não é previsível que seja aumentado o número de elementos com funções de fiscalização das situações aqui descritas bem como de outras.

Assim, por isso, apenas vemos como solução para um eficiente combate às explorações a que assistimos, a aposta na motivação dos agentes com competência de fiscalização, permitindo que possam usufruir de uma pequena percentagem dos valores das coimas. É uma evidência que as pessoas agem racionalmente, optando por fazer sobretudo o que lhes traz benefícios e evitam o que lhes causa embaraço e prejuízo.

O actual quadro, em que tanto faz fiscalizar como não fiscalizar, ou seja, ganha-se o mesmo produzindo ou não produzindo deve ser combatido com urgência por ter um efeito potenciador da inércia e da indiferença.

Os defensores e principais beneficiários do actual estado da nação dirão que é ilegal que o agente fiscalizador beneficie com a autuação. É verdade! Pois então torne-se legal a bem de todos, sobretudo daqueles que nada têm a temer...