FALAR VERDADE III


Conforme prometido, pela terceira e última vez debruçamo-nos sobre os dados do Relatório de Segurança Interna de 2005. Depois de termos analisado comparativamente os números referentes à criminalidade praticada contra as pessoas e a criminalidade praticada contra o património, resta-nos a criminalidade praticada contra a sociedade, contra o Estado e a denominada criminalidade de legislação avulsa, ou seja, a criminalidade que não faz parte integrante do Código Penal mas sim de diversos diplomas legais que tipificam determinados comportamentos como crime, servindo de exemplo a condução de veículo a motor sem habilitação legal, a emissão de cheque sem provisão e até o tráfico de droga, entre outros.

Embora tratando-se de três agrupamentos criminais, o seu peso em termos de criminalidade total denunciada é diminuto representando 7,89%.

Começando pelos crimes praticados contra a sociedade, representam 3,47% de todos os crimes denunciados nos Açores, enquanto a média nacional é de 4,06%. Como comportamentos mais expressivos deste tipo de criminalidade temos a condução de veículo a motor sob a influência de álcool e os crimes de incêndio.

Apesar de a taxa média de detenção de condutores sob a influência de álcool nos Açores ser idêntica à média nacional, os crimes contra a sociedade apresentam nos Açores um peso menor que a média nacional sobretudo devido aos crimes de incêndio que como se sabe nesta região são raros devido ao tipo de vegetação existente e aos índices de humidade relativa do ar, embora o fogo posto em residências, por cá, também tenha algo que se lhe diga, mas será tema de outra abordagem. Portanto, quanto aos crimes contra a sociedade não é possível tirar muitas ilações por serem realidades diferentes destacando-se apenas o facto de terem uma menor expressão que a verificada a nível nacional.

Quanto aos crimes praticados contra o Estado, com apenas uma diferença de catorze décimas (0,52% média Nacional e 0,66% média Açores), servem também para ajudar a compreender aquela tendência dos Açores, Madeira e Bragança de ano após ano apresentarem as mais elevadas taxas de criminalidade praticada contra a pessoas, por estes crimes serem sobretudo os crimes praticados contra os agentes de autoridade (injúrias e/ou agressões) e os de desobediência qualificada, sendo o caso típico do indivíduo que tem o veículo automóvel apreendido por falta de seguro, mas que continua a circular com ele.

Ao falarmos dos crimes contra o Estado falamos então de um tipo de criminalidade de cerca de 1% de 10.437, mas que, dados os seus contornos, deve merecer por parte da comunidade açoriana uma profunda reflexão do porquê de termos esta propensão mais elevada para desrespeitar as Autoridades que a verificada a nível nacional.

Por último mas não menos importante surge a criminalidade de legislação avulsa que tem também por cá uma maior representação que a nível nacional. Tem expressão a nível regional neste agrupamento a condução sem habilitação e os crimes de tráfico de droga.

A condução sem habilitação tem na região um peso forte quando comparado com o nacional, o que não pode ser dissociado da deficiente rede de transportes públicos terrestres bem como do facto de os níveis de escolarização da região serem mais baixos que os nacionais, fazendo com que exista um grupo de indivíduos significativo que, por dificuldades de obtenção do referido título em conjugação com as actividades profissionais que desempenham e respectivas necessidades, tenha maior propensão para conduzir sem habilitação.

O tráfico de droga, sendo uma criminalidade com visibilidade e alvo de forte censurabilidade social e judicial, representa 1% de toda a criminalidade praticada nesta região.

Os números valem o que valem, todavia acreditamos que se os analisarmos com objectividade poderemos dar razão a quem a tem e calar os que, cegos pelo livor, não conseguem ver...