2.350.000 INFRACÇÕES POR ANO!
É recorrente ouvir-se que a Polícia tem uma apetência particular para autuar os condutores, ou, como se usa dizer na gíria, para «multar» excessivamente. Confesso que durante os quase dez anos em que fui Agente da PSP, embora reconheça ter produzido alguns estragos na carteira de alguns cidadãos, nunca me deu qualquer prazer autuar fosse quem fosse, bem pelo contrário!
Tal como muitos outros analistas, sempre tive a ideia de que todas as Polícias, em Portugal, autuavam muito pouco, sendo mesmo um problema transversal, o qual, em parte, também serve para justificar o nosso atraso estrutural, fruto duma apetência férrea por nos deliciarmos com boas leis, mas de tão boas que são, interiorizamos que não vale a pena cumprir e respeitar. Essa nunca foi uma questão nossa, mas sim dos outros...
Embora se diga com frequência o que acabei de dizer, não tinha ainda encontrado, em parte nenhuma, dados estatísticos que servissem para fundamentar a nossa apetência para a infracção em contraponto com o déficit de fiscalização existente no nosso país. Foi tal cenário que me moveu, no estudo «Sinistralidade Rodoviária – Da Evidência à Realidade», publicado pelas Edições Macaronésia, e que está à disposição do leitor, a encontrar justificações para fundamentar aquilo que não estava cientificamente fundamentado.
Através do cruzamento da informação estatística policial com a informação recolhida através do «Inquérito à Sinistralidade Rodoviária nos Açores – 2006» junto de 800 condutores habituais, residentes nas nove ilhas açorianas, encontrámos a resposta que procurávamos! Nos Açores, com base na média registada entre 2000 e 2005, são levantados 23.500 autos por infracções cometidas contra as normas estradais, representando para os cofres do Estado qualquer coisa como 2.200.000,00 de euros por ano. Há quem diga que são muitos autos, há quem diga que é muito dinheiro...Será que é mesmo assim?
Quando inquiridos os condutores, verificámos que com facilidade assumem exceder os limites máximos de velocidade, facilmente assumem estacionar os seus veículos indevidamente, facilmente assumem mudar de direcção sem previamente assinalar a intenção, facilmente...facilmente...facilmente... representando um número surpreendente de infracções às mais elementares regras de circulação rodoviária.
Estimámos que no total das nove ilhas açorianas se pratiquem à volta de 2.350.000 infracções por ano, permitindo-nos concluir que, infelizmente, a probabilidade de um indivíduo praticar uma infracção e ser responsabilizado pela Polícia é da ordem de 1%. Ou seja, por cada 100 infracções praticadas pelos condutores nos Açores apenas uma infracção é punida. Esta é a realidade, como o Povo costuma dizer, «nua e crua»!
Com a presente demonstração terminou a possibilidade de se afirmar que a Polícia autua muito. Na realidade são muito poucas as infracções praticadas e que são efectivamente punidas, havendo mesmo motivos para que as pessoas se indignem e se manifestem no sentido da necessidade de as Polícias, em Portugal, adoptarem, nesta matéria, uma postura bem mais rigorosa e mais autuante.
Embora colectivamente tenhamos uma tendência para protestar publicamente por tudo e mais alguma coisa, estou certo de que nunca veremos a população portuguesa a exigir mais autuações...Talvez também seja por isso que «se calhar» vamos continuar a ter números de sinistralidade rodoviária que nos envergonham!
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