O REGRESSO ÀS AULAS

Ai está mais um regresso às aulas. Práticas repetidas, rotinas retomadas, oportunidades aproveitadas por uns desperdiçadas por outros. O governo, como se tem repetido com todos os governos, em todas as legislaturas, ano após ano, desta feita não quis também deixar de estar presente.

Pelo que pudemos constatar, a participação dos diferentes responsáveis políticos foi pensada ao pormenor, neste arranque do ano lectivo. É compreensível a visibilidade que se pretendeu atribuir ao evento, demonstrando de forma clara que o investimento na formação e em educação é sem qualquer margem para dúvidas o mais importante para um país que tem 10% da sua população analfabeta.

A estratégia mediática para o regresso às aulas deste ano, talvez idealizada pela Ministra da Educação e abraçada por todo um governo, centrou-se na distribuição de 2.000 computadores portáteis e ligações à internet em banda larga a alunos e professores, a baixo custo. Diga-se em bom abono da verdade, muito pouco para um universo de mais de 1.600.000 pessoas entre alunos e professores.

Se a filosofia e a mensagem subjacente à distribuição de computadores portáteis, em nosso entender, acaba por ser um sinal, apesar de escasso, positivo para o esforço de massificação da difusão das novas tecnologias, o mesmo não se pode afirmar em relação ao discurso político, sobretudo por ser contraditório, constituindo o mais cabal exemplo de demonstração de como as estatísticas podem servir para fundamentação de uma afirmação e ao mesmo tempo, precisamente, o seu contrário, se não, vejamos.

Foram apresentadas pelo governo, como uma vitória, as estatísticas demonstrativas do aumento da população escolar bem como do aumento das taxas de sucesso escolar. A oposição deu eco às estatísticas demonstrativas do aumento das taxas de abandono escolar. Quem terá mais razão? O que será mais importante afinal?

Em bom rigor, ninguém, nem governo nem oposição, está a fazer uma utilização adequada das estatísticas escolares visto que estamos perante variáveis dependentes embora respeitantes a indicadores diferentes que constituem um mesmo universo.

É sabido que as políticas sociais cujo usufruto está dependente da obrigatoriedade de frequência escolar por parte dos filhos menores dos beneficiários faz aumentar a população escolar e aumentará tanto quanto mais eficazes forem os mecanismos de controlo da aplicação desses mesmos apoios sociais. Por outro lado é também sabido que a população que apresenta maiores taxas de abandono é aquela que mais dificuldades tem de inserção em meio escolar, que maiores taxas de insucesso escolar detêm e paradoxalmente a que mais beneficia das políticas de apoio social.

Conforme se verificou, com o aumento do abandono escolar por parte daqueles que mais contribuem para as taxas de insucesso escolar, a par da permanência dos alunos sem dificuldades de inserção em meio escolar, o resultado apenas pode ser o aumento do sucesso escolar a menos que na escola tudo esteja a falhar, a começar pela dedicação dos professores, o que acreditamos não ser o caso!

Ficam os reparos, mas o mais importante é deixarmos o nosso apreço a todos os professores, os verdadeiros responsáveis pelo arranque de mais um ano lectivo sem incidentes, os quais lamentavelmente, no discurso político, ficaram esquecidos...