NÃO LEMBRARIA AO DIABO!

Conforme fez questão de anunciar o Ministério da Justiça, quem pretender adoptar uma criança, tem logo à partida que desembolsar 576,00€, ao que parece, para fazer face a despesas processuais incluindo os custos das fotocópias!!

Embora tenha também sido anunciado que, nos casos em que a adopção for concedida, os pais adoptantes, no final do processo, poderão ser reembolsados, a medida é verdadeiramente maquiavélica.

À luz da racionalidade, é difícil encontrar mérito na decisão anunciada, numa matéria em que o Estado deveria ser o primeiro interessado em que não existisse qualquer obstáculo e os processos fossem simples, céleres e eficazes.

Sabendo o que se sabe sobre os processos de adopção, se alguma coisa deveria ser desenvolvida neste âmbito seria um esforço de garantir o que há anos está fixado na letra da lei para que as crianças adoptáveis não se amontoassem em instituições de solidariedade social, infelizmente, na maior parte das vezes, incapazes de lhes assegurar projectos de vida adequados às reais necessidades.

Todos tínhamos conhecimento das incompetências do Estado quanto à forma como os processos de adopção se arrastam no tempo ao ponto de tornar crianças adoptáveis em crianças não adoptáveis. Agora que esse mesmo Estado, a quem estão cometidas tais responsabilidades, tantas vezes ignoradas, queira ganhar dinheiro à custa das famílias que de forma generosa e altruísta pretendem acolher no seu seio os mais necessitados de todos da nossa sociedade parece-nos algo chocante e atentatório da dignidade humana.

Apenas quem desconhece por completo os meandros de um processo de adopção, ou que não está na posse das suas plenas faculdades mentais, seria capaz de propor tal medida. Nem o diabo, sempre interessado em amealhar almas perdidas, teria capacidade para tal veleidade.

O que por motivos óbvios sempre foi um processo gratuito passa a ter custos pelo simples facto de se ser candidato. A mudança não faz qualquer sentido até porque, de acordo com as responsabilidades constitucionais, o Estado renega-se ao não facilitar o amparo de tais crianças.

Sem qualquer mérito, o resultado da medida anunciada apenas pode representar o afastamento de muitos dos potenciais candidatos a pais adoptivos levando ao engrossamento do lote de mais de doze mil crianças institucionalizadas, eternizando-as em valências sem capacidade de resposta, como tem sido sobejamente demonstrado nos casos do conhecimento de todos. Se é isso que o Estado pretende continuar a garantir, então está de parabéns!