DESAFIAR A REINCIDÊNCIA

O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, em articulação com os responsáveis máximos das diferentes forças e serviços de segurança, está a desenvolver esforços para que a libertação de presos preventivos, bem como as saídas precárias e condicionais, passem a ser controladas de modo completamente diferente do até aqui.

A ideia parece simples. O órgão de polícia criminal responsável pelo inquérito (investigação), que levou o indivíduo à prisão, fica com a incumbência de o controlar nas referidas saídas dos estabelecimentos prisionais, embora a força ou serviço de segurança mais próximo da área de residência do recluso também possa ter um papel a desempenhar.

A medida parece perspicaz e pode efectivamente ter impacto ao nível da redução das «malditas taxas de reincidência» que constituem o maior dos problemas e ao mesmo tempo o maior dos desafios em matéria criminal. Se conseguíssemos ter um efectivo controlo da propensão para a reincidência, conseguiríamos uma redução de cerca de 50% do total dos crimes.

Ou seja, dos 1154 crimes que por dia chegaram ao conhecimento das autoridades no território nacional, em 2008, passaríamos para qualquer coisa como 577 crimes diários, o que libertaria os efectivos com funções policiais para intervenções mais de cariz preventivo, bem mais do agrado do cidadão comum e claro mais adequadas à construção de um verdadeiro sentimento de segurança.

Dito desta forma tudo parece pacífico e simples de implementar. Todavia a experiência dita-nos que existem problemas estruturais profundos ao nível da organização e da articulação das diferentes forças e serviços de segurança. Continuamos a ter, fruto do modelo segmentado e descontínuo em vigor, problemas gravíssimos ao nível da troca de informações e da cooperação.

A continuidade do actual modelo não irá nunca permitir um eficaz controlo dos percursos e carreiras criminais dos indivíduos referenciados pelo sistema. Negar esta evidência é uma revisitação à «alegoria da caverna». É preferir ver a sombra do que a imagem real.

Ainda me lembro, enquanto polícia, e não foi uma nem duas vezes, de ter andado a fazer investigações para descobrir o paradeiro de indivíduos procurados pela justiça portuguesa quando se encontravam presos à ordem do mesmo tribunal de comarca apenas diferindo de juízo. Com níveis de comunicação destes como se conseguirá todo o resto?

Sejam bem-vindos ao mundo real!