LIÇÕES PERDIDAS

Na sequência de um evento ocorrido na Ilha Terceira, foi mais uma vez anunciado pelo Governo Regional que não haverá mais bairros sociais nos Açores. Apesar de, já no final da anterior legislatura, o Secretário Regional, José Contente, ter anunciado tal decisão, o assunto foi repetido até à exaustão na comunicação social regional.

Fiquei mesmo com a impressão que já ninguém se lembrava de tal promessa.

Tal como na altura saudei, saúdo novamente pelo mérito que a iniciativa encerra. No entanto não posso deixar de afirmar ter a convicção, a menos que a vida me pregue uma partida, que ainda irei assistir à construção de muitos mais bairros sociais.

Quem se preocupa com estas problemáticas sabe que a denominada Sociologia Ecológica, cuja referência maior é Robert Park, pertencente à Escola de Chicago, demonstrou como o ordenamento espacial condiciona os hábitos e práticas daqueles que o habitam.
Com quase cem anos que tal saber se tornou público apenas se pode lamentar que se continue a persistir nos mesmos erros.

Depois da experiência falhada que foi, em Ponta Delgada, o bairro social das Laranjeiras, ainda no tempo da vigência dos Governos de Mota Amaral, muitos outros bairros se multiplicaram por quase todos os concelhos açorianos na última década.

Quando assistimos, através da televisão, aos graves problemas de insegurança na Amadora, Loures, Setúbal, entre outros, incluindo pessoas com armas em punho aos tiros nas ruas e deslocações massivas de polícias dos corpos especiais para reposição da ordem pública, talvez muitos pensem que tais cenários são impossíveis nos Açores.

Puro engano. As sementes estão lançadas e podemos perfeitamente vir a ter de enfrentar no futuro problemas idênticos com grandes alterações da ordem pública. Por isso, é de todo conveniente que se evite tais possibilidades, porque certamente todos recordamos as dificuldades que surgiram para se controlar as graves alterações da ordem pública de 1996, em S. Miguel, com vários elementos policiais feridos e viaturas completamente destruídas, a propósito do preço do leite pago aos produtores.

Se o que melhor caracteriza os bairros sociais é o demérito de fazer com que os indivíduos que os habitam tenham mais dificuldade em se inserir socialmente e de melhorar as suas condições pessoais e familiares, na realidade, não faz qualquer sentido continuar-se a realojar pessoas em massa em tais espaços.

Em nome da racionalidade e da rentabilização dos recursos, com todas as demonstrações existentes, é de esperar que chegue a hora de se privilegiar a qualidade em detrimento da quantidade. No entanto, a experiência aconselha-me a esperar sentado, porque uma coisa é o que se diz, outra é o que se faz!