CONFIAR EM QUEM?

Esta é porventura uma daquelas semanas em que sobejam os motivos para se escrever uma crónica. De tamanha abundância o assunto praticamente se resolvia apenas com o enumerar de hipotéticas temáticas a abordar e de imediato ficaria para a história (se é que alguém, algum dia, se vai interessar pela balbúrdia em que vivemos actualmente) um autêntico catálogo de más práticas, ou dito de outra forma uma verdadeira crónica de maus costumes.

Não vamos falar sobre o definhar das finanças públicas, com uma quebra de receitas e um aumento da despesas, cujo diferencial entre o dever e o haver, esta semana, assumidamente já ultrapassou os 8%.

Não vamos falar do desemprego que semana após semana atinge os maiores valores de sempre ultrapassando de forma avantajada o meio milhão de portugueses.
Não vamos falar do Ministro da Economia nem do Ministro da Defesa que quem sabe em nome do Primeiro-Ministro, ou melhor, em nome da defesa do Primeiro-Ministro, se atiraram à Justiça acusando-a de fazer «espionagem política».

Não vamos falar da politização da justiça nem tão pouco da judicialização da política como agora está tão na moda.

Vamos falar de algo bem mais elementar que fica a meio caminho entre tudo isto e que elegemos como demonstrativo dos tempos conturbados vividos recentemente numa autêntica deriva em que o país mergulhou em diversos sectores entre os quais o da segurança, sem que ninguém seja capaz de assumir o que quer que seja. Se não, vejamos.

A Procuradoria Geral da República através de um relatório que tornou público através do seu site veio esta semana desmentir o Relatório Anual de Segurança Interna de 2008 (RASI), aprovado na Assembleia da República, em Março de 2009. O referido RASI diz, na página 80, que a criminalidade denunciada, em 2008, cresceu 7,5%, em relação a 2007. Agora o Relatório da Procuradoria diz que a criminalidade denunciada em 2008, em relação a 2007, cresceu 16,1%, ou seja, houve mais 77.462 crimes atingindo os 557.884 crimes.

O RASI, através de uma nota, em aditamento, da responsabilidade do Gabinete do Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, diz que a delinquência juvenil «entenda-se os actos criminosos praticados por menores de 16 anos de idade», em 2008, o «fenómeno observou um decréscimo acentuado, relativamente ao ano de 2007, registando-se um total de 2.510 participações, o que corresponde a uma diferença percentual de -43,5% (menos 1.930 casos participados). Agora o relatório da Procuradoria-Geral da República vem dizer que no âmbito da delinquência juvenil em 2008, em relação a 2007, registou-se um aumento da ordem dos 5%, mais 452 casos atingindo os 9.159 casos (quase quatro vezes mais que o número apresentado pelo RASI).

É evidente que por detrás do que aqui denunciamos fica nas entrelinhas a existência de sérias dúvidas sobre o denominado funcionamento regular das instituições. Dito de outro modo, ficam sérias dúvidas sobre se as pessoas que estão à frente das instituições citadas à semelhança de muitas outras estão conscientes das respectivas missões? Ou se apenas ali estão a materializar a confusão generalizada que se instalou com as nomeações fundamentadas na confiança política em detrimento das nomeações fundamentadas na competência técnica, onde tudo pode ser feito em nome do pagamento de um favor?

Seja como for, o que nos parece é que cada vez mais temos menos pessoas em quem confiar…