UM CORPORATIVISTA MEDIEVAL

Foi esta semana anunciada a abertura de mais um curso de medicina resultante de uma parceria entre a Universidade de Aveiro e a Universidade do Porto, através do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, que irá criar mais 40 novas vagas para medicina e que pode ir até às 120.

José Sócrates, Mariano Gago e Ana Jorge decidiram anunciar a decisão precisamente na comemoração do 36.º aniversário da Universidade de Aveiro. Procurou-se dar alguma solenidade ao evento, o que foi em nosso entender acertado sobretudo pelo valor simbólico da decisão.

Se na anterior legislatura o discurso de tomada de posse de José Sócrates ficou marcado pelo anúncio da venda de fármacos nas grandes superfícies, dando um sinal da disponibilidade do Governo para combater os lóbis e os corporativismos, pena foi que na actual ninguém se lembrou de rentabilizar o potencial que tinha anunciar-se a criação de mais vagas para medicina.

Não existe em Portugal nenhum exemplo de melhor demonstração do poder das corporações, ao ponto de terem estrategicamente conseguido reduzir o número de vagas nos cursos de medicina nas décadas de 80 e 90, e até segundo as acusações do próprio Sindicato Independente dos Médicos, terem conseguido manter desactualizadas as listas de médicos para que os rácios médico/população fossem idênticos aos europeus.

Como era de esperar, o bastonário da Ordem dos Médicos, numa atitude típica de corporativismo medieval, veio a terreiro discordar da decisão do Governo ameaçando com a possibilidade de num futuro próximo haver médicos no desemprego. Nem vale a pena perdermos tempo com o que diz tão douta personalidade, porque como diz o povo «cego é o que não quer ver»! Como é possível afirmar-se que não há falta de médicos em Portugal e em particular nas especialidades de medicina geral e familiar?

Ainda bem que entre os Sociólogos não existe nenhuma Ordem para não haver a hipótese de aparecer um bastonário capaz de ver o que mais ninguém consegue ver. Se o país perante aquilo que todos vêem está como está, imagine-se o que não seria se só um ou dois fossem capazes de ver, e todos os outros estivessem vergados pela cegueira?

Depois de ter sido dado um passo idêntico em relação à Universidade de Faro e segundo as mais recentes avaliações está a ser um sucesso, a decisão do Governo foi acertada e só peca por tardia e por não ter ido ainda mais longe em número de vagas.

Contudo, estamos certos que a coisa não ficará por aqui, a menos que neste país as Ordens continuem a mandar mais do que os governos.
Bom, vou de férias! Bom Natal e até para o Ano!