CONDUTORES PARA TODOS OS GOSTOS!


Consideramos que os comportamentos dos condutores em geral, dada a homogeneidade que apresentam, podem ser agrupados em classes, ou tipos. Não sendo uma questão consensual, podendo, portanto ser discutível, nem por isso nos abstemos de ensaiar uma caracterização possível.

Dentro de cada uma das classes, os condutores tendem a comportar-se de forma típica e a prolongarem no tempo os respectivos comportamentos e atitudes, e apenas acontecimentos relevantes se apresentam com capacidade para modificar hábitos e vícios.

Não sendo estanques as barreiras que delimitam as classes, é possível encontrarmos em determinados condutores comportamentos pertencentes a mais de uma classe. Nesses casos, o condutor é referenciado como pertencente à classe que reúne a maior frequência de comportamentos típicos.

Assim, dividimos os condutores em três classes: os condutores coerentes assertivos, os condutores gladiadores oportunistas e os condutores incoerentes perigosos.

Os condutores coerentes assertivos são aqueles que procuram cumprir todas as normas estradais, sendo incapazes de cometer infracções graves, ou muito graves, e de igual forma infracções leves. É o típico condutor capaz de percorrer um quilómetro a pé só para estacionar o veículo devidamente. São incapazes de transportar uma criança fora do dispositivo de segurança mesmo que faça a maior birra do mundo. São calmos, cautelosos, conduzem a velocidades moderadas, circulam o mais pela direita possível e cedem facilmente a prioridade aos demais condutores e peões. Guiam-se pela máxima de que «a segurança está sempre primeiro!»

Os condutores gladiadores oportunistas são a maioria dos condutores; apoiados numa cultura do desembaraço, mais propriamente do «desenrasca», não hesitam em praticar uma infracção às normas estradais, independentemente da gravidade e da sanção prevista, desde que dela resulte um benefício imediato. Os seus comportamentos demonstram que o importante é não perder as oportunidades para não ter de se sujeitar ao congestionamento do tráfego. Excedem facilmente os limites de velocidade, justificando que o fazem porque estão reunidas todas as condições de segurança, o que na realidade nem sempre é verdade. Guiam-se pela máxima de que «o importante é desenrascar!»

Os condutores incoerentes perigosos são perigosos na verdadeira acepção da palavra. Assumem frequentemente, durante a condução, posturas agressivas. Se fossem obrigados a sujeitarem-se a uma avaliação psicológica, o mais provável é que não pudessem conduzir qualquer tipo de veículo. Consideram-se condutores excepcionais e perante uma conversação sobre condução tendem a revelar um discurso incoerente, culpabilizando tudo e todos. Apresentam elevada propensão para o excesso de velocidade e defendem que não deveria haver limites máximos de velocidade. Não hesitam em ultrapassar pela direita na mais «pequena aberta». Quando repreendidos por uma buzinadela, não hesitam em reagir, partindo facilmente para a injúria, para a ameaça e até para a agressão como se estivessem cheios de razão. Guiam-se pela máxima de que «não querem saber dos outros para nada!»

Curiosamente, ou talvez não, os condutores gladiadores oportunistas e os condutores incoerentes perigosos são os principais responsáveis e ao mesmo tempo as principais vítimas da sinistralidade rodoviária.

E você, que tipo de condutor é? Neste mês de Novembro, em que se comemora, no dia 16, o «Dia Europeu da Memória das Vítimas da Sinistralidade Rodoviária», faça o teste através de uma reflexão sobre a forma como se costuma comportar na via pública...

AS FUGAS À RESPONSABILIDADE


Os acidentes em que um dos condutores se põe em fuga, não raras vezes, incorporam um concurso de crimes, ou seja, vários crimes em simultâneo, desde logo o consignado no artigo 200.º do Código Penal que define, como “omissão de auxílio”, o caso de necessidade, nomeadamente, provocada por acidente, que ponha em perigo a vida, integridade física ou a liberdade de outra pessoa. Não sendo prestado auxílio para o afastamento do perigo, por acção pessoal ou pedindo socorro, o responsável é punido comaté um ano de prisão ou com pena de multa até 120 dias. Se a situação de perigo tiver sido criada pela pessoa que não prestou o auxílio, como, por exemplo, num acidente, o não prestador de auxílio é punido até dois anos de prisão ou com pena de multa até 240 dias.

Incorpora uma violação ao previsto no artigo 291.º do Código Penal como “condução perigosa de veículo rodoviário” aquele que, violando grosseiramente as regras de circulação rodoviária, criar perigo para outrem ou para bens patrimoniais alheios, sendo punido até 3 anos de prisão ou pena de multa.

Só em Ponta Delgada, no 1.º semestre de 2003, ocorreram 91 acidentes em que um dos condutores envolvidos se pôs em fuga, alegadamente porque não possuía habilitação legal para conduzir, ou porque não possuía seguro válido. Nos Açores, durante o ano de 2004, ocorreram 217 acidentes, num dos quais o condutor envolvido se pôs em fuga perfazendo uma média de 18 acidentes mensais deste tipo. Em 2005, voltaram a ultrapassar as duas centenas.

Os números falam por si não necessitando de grandes explicações para que sejam entendidos e mereçam a nossa reprovação colectiva. Todavia, o facto de o trazer hoje para tema desta crónica é para que as pessoas entendam que a fuga é uma situação que nada resolve bem pelo contrário apenas serve para agravar a responsabilidade do condutor.

Se eventualmente não estava habilitado para conduzir aquele tipo de veículo, ou se não tinha seguro, o facto de se ter posto em fuga vai fazer redobrar os esforços policiais no sentido da sua identificação e consequente responsabilização. A fuga tem o mérito de fazer aumentar grandemente a probabilidade de não se ficar impune.

São acidentes bastantes trabalhosos para as forças policiais por exigirem um grande número de diligências até que se identifique o verdadeiro responsável, pois não raras vezes o veículo não se encontra registado em nome do verdadeiro proprietário, por ter sido revendido várias vezes, mas felizmente em cerca de 80% é possível identificar o condutor em fuga, nos dias que se seguem ao acidente, portanto num espaço de tempo muito curto, através do número de matrícula que a vítima ou uma testemunha ocular consegue reter ou através dos vestígios deixados na vítima, na viatura da vítima e no local em que ocorreu o acidente.

Todos ainda se devem recordar de um caso que chocou particularmente a população de S. Miguel, em 2001, em que uma menina foi atropelada mortalmente por um jovem que se pôs em fuga, junto à Escola dos Frades, no concelho de Lagoa, acabando por ser muito rapidamente identificado pela Polícia que encontrou vestígios de sangue, cabelos e fragmentos do vestuário da vítima na parte inferior do veículo. O indivíduo em questão acabou por ser condenado, em tribunal de primeira instância, a dois anos e meio de prisão efectiva.

É caso para dizer que o crime não compensa e sempre é melhor assumir um ou dois erros do que meia dúzia com a agravante de deixarem um peso na consciência que não se apaga facilmente...