GESTÃO DESASTROSA!

O caso Freeport teve o mérito de mais uma vez pôr em evidência a forma desastrosa como a divulgação de assuntos relacionados com a justiça se tem feito e como se irá fazer no futuro, pelo menos no futuro mais próximo.

Desde a Procuradora responsável pela condução da investigação do caso, que se desdobrou em entrevistas e mais entrevistas sobre o caso que era suposto estar sob o segredo de justiça, passando pelo próprio Procurador-Geral da República, que também foi ajudando à festa com algumas tiradas, os interlocutores em questões deixaram-nos boquiabertos, ou talvez não!

Pela voz de Pinto Monteiro ficamos a saber que o processo em quinze dias teve um maior desenvolvimento do que durante os últimos quatro anos, sem que o próprio saiba explicar porquê, apesar da curiosidade. Por isso ordenou a abertura de um inquérito para perceber o que se passou! Talvez seja mais um inquérito, como muitos outros que não chegaram a conclusão nenhuma…

A impressão que ficou em todos nós foi de que ou as violações ao segredo de justiça foram a rodos, ou então o Ministério Público, neste processo, tal como tinha acontecido noutros processos mediáticos, foi a reboque da comunicação social.

Quem tem seguido através da comunicação social praticamente todos os processos mediáticos, tem ficado com a sensação de que quem em determinados momentos dirige as investigações sãos os próprios jornalistas, e os investigadores criminais vão a reboque. Talvez por isso, nas anteriores investigações sobre os autores das fugas de informação, sistematicamente não sejam identificados!

Percepções à parte, a maior falha que pode ser apontada a todos os operadores do sistema de justiça tem a ver com a falta de profissionalismo na abordagem com a comunicação social. A falta de pessoas habilitadas para lidar com a comunicação social em exclusividade é o grande problema.

Neste país, dar a cara à comunicação social em representação de uma determinada instituição, aparecer na comunicação social, sobretudo nas televisões é visto como um prémio e não como uma tarefa a desempenhar com o maior dos profissionalismos em nome da melhor imagem da instituição representada.

A Igreja Católica, a mais secular das instituições, num período dramático da sua história, durante a agonia do Papa João Paulo II, entregou a gestão da informação a disponibilizar à comunicação social a um profissional que nada tinha a ver com o clero. Por que terá sido?

CUIDADO COM OS DESEQUILÍBRIOS!

Muitas das propostas que recentemente foram discutidas na Assembleia da República sobre a problemática da violência doméstica vão ser introduzidas numa lei com a finalidade de a prevenir bem como para proteger as vítimas de tais crimes.

De uma maneira geral nada do que foi divulgado é digno de discussão a não ser a possibilidade de o agressor poder vir a ser detido fora de flagrante delito, indo muito para além do quadro actual em que o agressor só pode ser detido em flagrante delito ou nos casos em que se reputa o flagrante delito, ou seja, na gíria, nos casos de flagrante e/ou de quase flagrante.

Compreendo o porquê das alterações, as quais muito se devem às associações, instituições e demais técnicos. Por vezes o excesso de proximidade com o fenómeno cega. Por isso é preciso uma enorme ponderação para que «o passo não seja maior do que a perna!»

Tive conhecimento de um caso em que um indivíduo por ter ido ver um jogo de futebol para o café, contra a vontade da mulher, ao chegar a casa, tinha parte do recheio da habitação destruído e a mulher, irada, aguardava-o para se atirar a ele. O indivíduo, num quadro de perfeita legítima defesa, reagiu tendo a mulher chamado a polícia que efectuou a detenção do indivíduo considerando que se estava perante uma reputação de flagrante delito.

Com uma noite dormida no calabouço policial, o suposto agressor, após um longo inquérito, acabou absolvido em tribunal. A auto-intitulada vítima, não satisfeita, resolveu apresentar uma queixa contra o marido acusando-o de abuso sexual do filho de cinco anos de idade.

Interrogado pela Polícia Judiciária, acabou por ir conjuntamente com o filho e a mulher para o Instituto de Medicina Legal de Coimbra onde foi apurado que o indivíduo não possuía qualquer propensão para actos sexuais com crianças. A criança não apresentava qualquer indício de ter sido molestada sexualmente e em relação à mulher também sujeita a uma avaliação psicológica apurou-se que era uma mentirosa compulsiva.

É o receio de aumentar o número de casos como o descrito que me deixa receoso quanto à possibilidade de um hipotético agressor poder vir a ser detido fora de flagrante delito, o que poderá sem margem para dúvidas contribuir para a ocorrência de abusos, porque quem está no terreno, no momento, nem sempre dispõe de todos os elementos para proceder da forma mais acertada. Pois, como se sabe, muitas vezes as evidências enganam…Por isso todo o cuidado é pouco!!

NÃO SE PERCEBE!

Na semana passada, o Tribunal de Angra do Heroísmo absolveu quatro freiras e uma funcionária que desempenhavam funções no Lar Santa Maria Goretti pela suposta aplicação de castigos corporais a crianças institucionalizadas naquele lar.

O tribunal admitiu que foram praticados castigos corporais sobre as crianças. Justificando com a má instrução do processo, optou por absolver. Mas, então, Portugal não está entre os 23 países do mundo que punem os castigos corporais a crianças?

Como é de domínio público na altura em que o caso foi denunciado seguiram-se auditorias que acabaram por encerrar o referido lar. Convém recordar que o encerramento de uma instituição deve ser sempre entendido como uma decisão extrema e da máxima gravidade. É uma decisão do tipo das apelidadas de «bomba atómica». Apenas se percebe que a decisão de encerrar uma instituição ocorra num quadro de violação grosseira das normas e das boas práticas e de falta de condições ao nível das infraestruturas e/ou falta de habilitação dos técnicos/funcionários.

Assim a conclusão a que se chegou em tribunal, tal como tinha acontecido em outros processos e de que me recordo, nomeadamente no processo da Santa Casa da Misericórdia de Santa Cruz da Graciosa, no processo do Instituto Margarida de Chaves e agora no processo do Lar de Santa Maria Goretti, demonstra que começou a fazer escola uma certa superficialidade na investigação e posterior responsabilização dos visados.

O caso do Lar de Santa Maria Goretti é o mais grave de todos porque o lar foi encerrado, apurou-se que houve a aplicação de castigos corporais, mas não houve consequências para ninguém por má instrução do processo. Mas, então, quem foi/foram os responsáveis pela instrução do processo? Isto fica assim mesmo? Não há culpados? As crianças não foram vítimas de nada?

Só faltou concluir-se que tudo se deveu a excesso de zelo, e por esse andar, se calhar, o lar nem deveria ter sido encerrado!

Não há dúvida de que somos um país a fazer de conta e tudo isto dentro do real porreirismo apenas pode ser encarado com uma grande dose de boa disposição… ai se isto fosse um país a sério…!

DEIXAR TUDO COMO ESTÁ?

Soubemos esta semana que Norberto Martins, na qualidade de Presidente da Comissão de Fiscalização dos Centros Educativos, em Portugal, conforme fez saber, não concorda com a solução, encontrada nos Açores, para os menores que necessitam de internamento em centros educativos.

Parece óbvio que, à partida, juntar na mesma instituição menores referenciados pela prática de comportamentos desviantes com menores acolhidos por falta de protecção parental, não é a ideal das soluções, todavia convém saber bem de que falamos!
Durante anos, menores açorianos foram internados em centros educativos no continente por não existirem na região o que dificultou a aplicação dos princípios previstos na Lei Tutelar Educativa. Pelos vistos isso não é grave!

Como se sabe, Travis Hirschi através da teoria dos laços sociais (1960/70) demonstrou o que hoje não deixa qualquer margem para dúvidas. A melhor forma de inserir ou reinserir socialmente um indivíduo é apostar no reforço dos laços familiares. Como também é sabido, na grande maioria de casos, os laços familiares entre os membros que constituem os agregados referenciados são frágeis. Como tal, a estratégia mais adequada de intervenção passa por se trabalhar as competências psicossociais.

Por isso não se consegue compreender como foi possível durante anos ter-se permitido que menores com laços familiares frágeis, ao serem obrigados a ir para o continente, destruíssem o pouco que tinham em vez de o reforçar.

Claro que a solução encontrada e que o Presidente da Comissão de Fiscalização dos Centros Educativos criticou, não é o ideal, mas o facto de se avançar demonstra coragem por parte dos responsáveis na região nesta matéria. E isso não pode ser escamoteado.

Há uma aprendizagem que se tem de fazer. Não podemos ficar eternamente agarrados às situações de impasse e de adiar a resolução dos problemas. Dez anos de adiamento falam por isso. Avancemos com coragem e com toda a humildade para reconhecer as dificuldades e minimizar as consequências.

O caminho descrito é bem mais racional do que fazer de conta que está tudo bem!

ROTA? QUAL ROTA?

Em tempos que não posso precisar, mas que terão cerca de um ano prestei declarações à jornalista Ana Pereira da Agência Lusa sobre a impossibilidade de inclusão dos Açores na rota do tráfico internacional de droga.

As declarações então prestadas e agora abusivamente reproduzidas no jornal «Correio dos Açores» são corroboradas por inúmeras entidades que estudam e acompanham o fenómeno incluindo a própria ONU, e que apontam claramente no sentido de que os Açores não fazem parte das rotas internacionais de tráfico de droga.

A obra «O Poder da Droga na Política Mundial» de Yann Moncomble descreve a rota do haxixe entre o norte de África e o sul da Europa; a rota da heroína que foi durante anos através da Europa Central deslocalizou-se para o Norte de África e a rota da cocaína depois da travessia do Atlântico em direcção ao norte de África segue para o Sul da Europa considerada a principal porta de entrada.

A própria ONU através dos seus relatórios tem chamado a atenção para as deficiências de controlo no norte de África da Costa Atlântica e para o crescimento do tráfico de droga naqueles países, tendo ali recentemente realizado uma conferência internacional alertando para a possibilidade de alguns Estados africanos se transformarem em narco-estados. Têm mesmo sido disponibilizados meios para que ali se combatam as redes de tráfico internacional.

A bibliografia sobre o assunto é abundante e nem é necessário ler os relatórios nacionais para se concluir que os Açores sem margem para dúvidas não fazem parte da rota internacional do tráfico de droga o que não quer dizer que não existam embarcações mais ou menos isoladas e por motivos diversos possam navegar ao largo e que até eventualmente possam escalar os Açores. Aliás a excepção apenas serve para confirmar a regra.

Com quase uma década de leitura de relatórios e estudos sobre a matéria não conheço um único texto que fundamente a inclusão dos Açores na rota internacional de droga a não ser uma ou outra pretensa notícia de um ou outro/a jornalista que teima em colocar os Açores na rota internacional de tráfico de droga!

Convém recordar que não é por se fazer algumas apreensões de vulto como a registada esta semana de 300 quilos de cocaína num veleiro que terá passado por cá que os Açores fazem parte da rota internacional de droga. É preciso haver rigor e fundamentação naquilo que se diz!

FREEPORT E OUTRAS MOROSIDADES

Apesar de muitas promessas e das estatísticas apresentadas pelo actual Ministro da Justiça, após ter terminado com as famosas férias judiciais, «a bem dizer» nada tem sido feito para resolver o problema da morosidade da justiça que é estrutural e afecta toda a sociedade portuguesa.

Tenho a impressão que muitos de nós já nos conformámos com a lentidão da justiça e por mais que nos prometam mundos e fundos já ninguém acredita! De vez em quando lá surge um processo que traz para a praça pública a discussão em torno da morosidade da justiça.

O caso mais recente foi o processo Freeport, que, por envolver uma das principais figuras do Estado, desencadeou um chorrilho de coros de arautos sapientes, curiosamente alguns dos quais até foram responsáveis por algumas das normas que emperram o nosso sistema jurídico.

É consensual que a justiça deve ser cega e reger-se por normas gerais e universais. Já não é consensual que a justiça em relação ao caso Freeport deva ser bastante célere. Há mesmo quem defenda que o processo Freeport deve ser alvo de uma justiça tão diligente quanto o é em todos os demais processos.

Tem razão o Presidente da República quando diz que o processo Freeport é um assunto de Estado e como tal na conversa que teve com o Procurador-Geral da República não pôde deixar de solicitar para o caso uma investigação célere. Ao fim e ao cabo é a dignificação da imagem do próprio Estado que está em jogo não se podendo permitir um arrastar penoso.

Toda a argumentação vinda a terreiro sobre o caso tem a sua lógica o que em meu entender não tem lógica nenhuma é o facto de a justiça ser lenta no processo Freeport como em todos os processos que envolvem figuras mediáticas. Porque se assim não fosse o processo Freeport já estava resolvido e não estávamos a reclamar celeridade na justiça.

Na verdade a maior parte dos «pilha galinhas, bêbados e arruaceiros» até são julgados de forma célere sem que seja necessário alguém reivindicar celeridade!

FOI VOCÊ QUE PEDIU UM ANÚNCIO DE SEXO?

A revista New York, em Novembro de 2007, deixou de aceitar para publicação anúncios de cariz sexual. A decisão foi tomada por pressão da National Organization for Woman que, tendo-se manifestado em frente às instalações da New York, acusou a revista de ser «uma arma de marketing do crime mundial de tráfico humano».

Consciente de que possam existir outras interpretações, e salvo melhor opinião, entendo que a publicação de anúncios de cariz sexual fomenta, favorece e facilita a prática da prostituição e pode ser entendida também como uma forma de aliciamento à exploração sexual e ao tráfico de pessoas.

A publicação de tais anúncios, conforme previsto no Código Penal (CP) português, pode configurar comportamentos tipificados como crime nos artigos 160.º e 169.º. São crimes públicos e como tal não carecem de denúncia. Basta que se tenha conhecimento da situação através de um jornal.

Assim, não se percebe como há vários anos sejam publicados na imprensa nacional e regional anúncios de cariz sexual. Há jornais (não os cito para não fazer publicidade) em que até são publicadas fotografias com os corpos ou partes dos corpos acompanhados de dizeres como: «Carol...Oral Natural até fim…Completa…acessórios e deslocações a hotéis…24 horas (tel […]); «Vânia…19 anos…Peitinho 42! Boca natural. Bumbum todinho. Corpo ardente. 30P…Vale tudo…Deslocações (tel […]); «1.ª vez em S. Miguel morena linda, sensual, carinhosa, e quentíssima, dvd e acessórios, oral quentíssimo (tel […]).

Perante tais factos, não se percebe como tudo isto continua sem qualquer responsabilização. A começar pelos próprios jornais que são os primeiros beneficiados. Se isto não é beneficiar, facilitar ou favorecer a prática da prostituição e da exploração sexual então não sei o que isso é nem para que serve o previsto nos artigos do CP citados.

É estranho que também por cá, para além do Ministério Público, instituições como a UMAR, a APAV, entre muitas outras, não assumam a postura da National Organization for Woman que levou a revista New York a entender que o que está em jogo acima de tudo é uma questão de dignidade humana.

A DIMENSÃO DAS COISAS…

Pedro Resendes, mais conhecido por Pauleta, foi esta semana homenageado. Foi uma homenagem justa, merecida e estou certo que muitas outras se seguirão até porque não será fácil alguém igualar os seus feitos nomeadamente o de melhor marcador de sempre da selecção nacional.

A cerimónia teve bastante dignidade tendo sido inúmeras as entidades públicas e privadas que se quiseram associar ao evento. Desde cidadãos anónimos, políticos e dirigentes nacionais, regionais e locais todos se associaram, à partida, para dar brilho à homenagem.

Nada quanto foi dito merece qualquer reparo da nossa parte, bem pelo contrário, contudo não posso deixar um lamentável reparo que se prende com a associação do BANIF ao evento.

É evidente que o BANIF no âmbito das suas campanhas promocionais e de marketing é livre de seguir a estratégia que entender e com quem o aceitar. Assim, não espanta que se tenha associado no sentido de tirar proveito da imagem de um atleta de eleição.

Talvez por isso, ou talvez não, o BANIF, além de se associar ao evento, decidiu homenagear o atleta com uma medalha de ouro. Foi criado um espaço decorado com os símbolos do Banco, conforme vimos através das imagens televisivas com alguns dos dirigentes perfilados para um registo para a prosperidade. Tudo bem, também não foi por aqui que mereceram qualquer reparo. Agora que tenham oferecido uma pequena caixa com uma medalha de ouro idêntica àquelas que oferecemos ao filho do nosso compadre de quem aceitamos ser padrinho parece-nos de pouca dignidade e não prestigiou o Banco.

As atitudes ficam com quem as toma, mas que o Pauleta por tudo quanto nos deu e por tudo quanto deu ao Banco merecia algo mais digno… embora, tal como devem ter pensado os dirigentes do BANIF, nem tudo se meça pelo tamanho!